Aspectos Atuais da Reconstrução da Mama

A reconstrução mamária é parte do tratamento global do câncer de mama e desempenha importante papel no difícil processo de reabilitação. O enfoque multidisciplinar, o planejamento pré-operatório e a indicação individualizada e correta de diferentes técnicas são fundamentais para o sucesso da reconstrução e satisfação com o resultado.

sábado, 8 de maio de 2010

Cirurgia Oncoplástica em Destaque

Aspectos Atuais da Cirurgia Oncoplástica

Publicado recentemente pelo site Terra*, a reconstrução mamária e, sobretudo os conceitos da cirurgia oncoplástica tem mostrado uma maior difusão e incorporação na área de atuação da mastologia moderna. Sabe-se atualmente que o câncer de mama representa, após o câncer de pele, o tumor mais frequente do sexo feminino nos países desenvolvidos.


No nosso meio em regiões mais desenvolvidas e com níveis de IDH mais elevados, é o tumor mais prevalente na mulher na faixa etária de 40 a 50 anos. Em outras regiões e com níveis de saúde pública inferiores representa o 2o. tumor mais frequente ficando atrás do câncer de colo do útero. Desta forma e ciente que o tratamento é eminentemente cirúrgico, os aspectos de reabilitação e preservação da imagem corporal devem estar intricados no tratamento global do câncer mamário.

Início do Cirurgia Oncoplástica
O conceito de oncoplástica é realizado no Brasil desde a década de 80 com o desenvolvimento da reconstrução mamária imediata (no mesmo momento da mastectomia). A partir dos anos 80 e sobretudo 90 começaram a preservar parte da mama em casos de câncer inicial. Assim foram desenvolvidas também técnicas de reconstrução parcial da mama utilizando os mesmos princípios das cirurgias estéticas mamária como suspenção, redução e colocação de próteses. Nesta época (meados da década de 90) coube a um cirurgião alemão (Werner Audretsch) descrever um termo/expressão para o conceito que já vinha sendo feito habitualmente em pacientes com tumores avançados e iniciais da mama. Assim, foi criado o conceito e a expressão de cirurgia oncoplástica que é a utilização de técnicas de cirurgia estética da mama em situações onde a paciente tem câncer e necessita de reconstrução.


Prevalência da Cirurgia Oncoplástica
Não há números exatos quanto à reconstrução pois estas cirurgias não tem notificação compulsória. Estima-se que no Brasil, menos de 10% das mulheres com câncer de mama diagnosticados fazem alguma técnica de reconstrução de mama/oncoplástica. Logo o número é bem pequeno. Para se ter uma idéia qto ao número de câncer de mama estima-se (dados do INCA) que o número de casos novos de câncer de mama esperados para o Brasil em 2008 é de 49.400, com um risco estimado de 51 casos a cada 100 mil mulheres. Na região Sudeste, o câncer de mama é o mais incidente entre as mulheres com um risco estimado de 68 casos novos por 100 mil. O câncer de mama é o segundo tipo de câncer mais freqüente no mundo e o mais comum entre as mulheres. A cada ano, cerca de 22% dos casos novos de câncer em mulheres são de mama.


Qualidade de Vida e Reabilitação
No que tange à qualidade de vida das pacientes submetidas à cirurgia conservadora e em específico após aplicação de técnicas de cirurgia oncoplástica não há estudos clínicos específicos sobre o tema. A aplicação mais recente e em maior número destes procedimentos oncoplásticos associado à dificuldade de avaliação objetiva da qualidade de vida destas pacientes podem estar implicados na escassez de ensaios clínicos sobre o assunto. Um estudo interessante publicado recentemente pelo grupo de Ann Harbor/Universidade de Michigan avaliou o impacto do resultado estético pós cirurgia conservadora da mama na função psicosocial e na qualidade de vida de pacientes com câncer de mama precoce. Em uma análise retrospectiva de 4 anos envolvendo 714 pacientes, foram avaliados alguns aspectos relacionados à qualidade de vida global, estigmatização, depressão, medo de recorrência e alteração na percepção da saúde. Apesar do emprego de escalas não validadas no que tange a mensuração da qualidade de vida, os autores observaram que pacientes com grave assimetria mamária pós-operatória apresentaram piores índices de qualidade de vida e maior incidência de depressão que as pacientes com mamas simétricas ou com assimetria leve. Ademais, os autores propõem que na identificação precoce de assimetrias pós-operatória há a necessidade de acompanhamento psicológico e suporte com intuito de prevenção na redução da qualidade de vida.


Perspectivas Futuras
Atualmente não há consenso quanto a melhor técnica de reconstrução para cada caso. Vários são os fatores relacionados na indicação de cada técnica, todavia a maioria dos estudos científicos demonstram bons resultados com a maioria das técnicas disponíveis. Na grande maioria das situações os critérios são baseados na experiência pessoal do cirurgião e, em algumas vezes, na aplicação direta de técnicas habitualmente usadas em cirurgias mamárias estéticas.

O desenvolvimento de novos procedimentos e o aperfeiçoamento de técnicas e táticas estabelecidas são comuns na evolução da cirurgia e, sobretudo na mastologia. Desta forma, a introdução e o estabelecimento da cirurgia oncoplástica moderna também contribuiu na reconstrução após a cirurgia do câncer de mama. A aplicação destas técnicas de reconstrução durante o tratamento inicial do câncer de mama favorecem a recuperação e a reabilitação da paciente.
No contexto multidisciplinar, o intercâmbio de informações e técnicas entre o cirurgião plástico e o mastologista são fundamentais para o resultado final da cirurgia conservadora e a satisfação por parte das pacientes com o resultado estético. Ademais, a discussão do planejamento cirúrgico com a paciente em conjunto com a equipe multiprofissional e a individualização do tratamento, salientando os aspectos inerentes a cada paciente, formato de mama, localização tumoral e limitações técnicas são os pontos preponderantes na opção do melhor procedimento e a obtenção dos melhores resultados.



sábado, 1 de maio de 2010

Treinamento em Cirurgia Oncoplástica e Papel das Diferentes Especialidades

Dr. R. Rainsbury (UK), D. Mcmillan (UK), M.J.Cardoso (Portugal) e Alexandre Mendonça Munhoz, no painel de cirurgia oncoplástica no Algarve/Portugal 2009.
Training in oncoplastic surgery: An international consensus. 
The 7th Portuguese Senology congress, Vilamoura, 2009
Cardoso, MJ; McMillan, D.; Merck, B.; Munhoz, A.M.; Rainsbury, D.

The Breast, 2010.


A reconstrução da mama apresentou significativo progresso nos últimos anos, fato este decorrente do maior esclarecimento das técnicas pelas especialidades médicas envolvidas bem como o melhor conhecimento da anatomia vascular cutânea e a aplicação e validação de novos procedimentos. O desenvolvimento de novos retalhos cutâneos e, sobretudo músculo-cutâneos associado à transferência de tecidos vascularizados a distância possibilitaram ao cirurgião novas opções frente a paciente com câncer de mama e submetidas à ressecções extensas e, sobretudo na cirurgia conservadora da mama. A necessidade de protocolos de condutas e padronização na opção da melhor técnica para cada tipo de ressecção e anatomia mamária torna-se fundamental para se auferir bons resultados.


É fato também que muitos dos conceitos e a liberdade de transposição de técnicas habitualmente empregadas na cirurgia estética da mama para a cirurgia oncológica foram decorrentes da iniciativa e criatividade da cirurgia plástica moderna, mas também essa liberdade só se tornou viável devido ao conceito multi-disciplinar e do convívio saudável com inúmeros colegas mastologistas. Na verdade, muitos destes ideais foram decorrentes do impulso inicial de um grande professor, José Aristodemo Pinotti, incansável incentivador da aplicação de procedimentos de cirurgia estética mamária no tratamento conjunto da cirurgia conservadora da mama. 
Dr. Alexandre Mendonça Munhoz e Prof. Pinotti (2001)
Já na década de 90, era quase que rotina não apenas no serviço público mas também em sua clínica privada, a participação do cirurgião plástico não apenas na cirurgia propriamente dita, mas também na discussão de opções técnicas e táticas com objetivo não apenas de reconstruir mas também de melhorar o resultado estético das pacientes com diagnóstico de câncer mamário.
Publicado no último número do periódico inglês The Breast, o resultado do consenso internacional realizado em novembro último em Portugal com diferentes especialistas da Europa. Neste consenso, diferentes realidades sobre a atuação da cirurgia oncoplástica no tratamento global do câncer de mama foram discutidas e ponderadas. O dilema exite independente da fronteira; 


Qual o treinamento ou pré-requisito necessário para um competente cirurgião oncoplástico ? Quem é o melhor profissional para exercer esta função ? Quais são os limites de atuação de cada profissional das especialidades pertinentes na área de mastologia ? Talvez muitas das questões não apresentem respostas imediatas e várias controvérsias semelhantes a estas foram levantadas no evento em Algarve por meio da discussão com vários especialistas. Neste evento, Dr. Alexandre Mendonça Munhoz participou representando o Brasil e o Hospital Sírio-Libanês onde foram abordados diferentes temas sobre a formação do cirurgião oncoplástico e o treinamento nos diferentes países. No evento participaram além do Dr. Alexandre Munhoz, os Drs. Richard Rainsbury e Douglas McMillan representando a Inglaterra, a Dra. Belén Merck da Espanha e a Dra. Maria João Cardoso da cidade do Porto/Portugal.

Interessante que nos diferentes países, formações e culturas apresentam a mesma evolução e similares questionamentos sobre as áreas de atuação dos diferentes profissionais. É fato que não há consenso atual sobre quem é o melhor especialista para atuar na reconstrução mamária. Sabe-se ainda que diferentes profissionais com enfoques e treinamentos distintos atuam na cirurgia reparadora da mama, uns com procedimentos simples e outros com técnicas mais complexas ou mesmo empregando implantes de última geração e microcirurgia. Há atualmente excelentes e competentes profissionais nas distintas áreas médicas pertinentes, quais sejam a mastologia, cirurgia plástica e oncológica. É fato também que o profissional de formação isolada e única apresentaria limitações na abordagem global e complexa que é o câncer de mama. Atualmente, e pensando no objetivo final de qualquer tratamento que é a cura e a reabilitação, alguns procedimentos mastológicos não teriam seu sentido sem técnicas de reconstrução mamária imediata.

No Brasil existem diferentes cenários a depender da região e a proximidade com grandes centros e universidades. Grupos multidisciplinares atuam em conjunto na abordagem global do câncer de mama e em sua maioria são vinculados a grandes universidades com hospitais universitários de nível terciário ou hospitais privados com centros de oncologia. Nestes centros, há de maneira geral uma relação harmônica e a perfeita troca de informações e discussão conjunta de condutas entre cirurgiões oncológicos, mastologistas e cirurgiões plásticos. Cirurgiões plásticos realizam habitualmente a reconstrução e mastologistas/cirurgiões oncológicos realizam o tratamento do câncer de mama. Em um outro panorama, e principalmente em regiões mais afastadas dos grandes centros, a abordagem não ocorre de maneira multiprofissional e sim um tanto isolada. Em várias situações não há a presença do cirurgião plástico, fato este que limita a atuação do mastologista. Assim, cirurgias oncológicas de objetivo estético como mastectomias com preservação de pele, adenomastectomias ou mesmo cirurgias conservadoras tem sua indicação limitada frente a ausência ou mesmo limitação técnica da reconstrução imediata. 
A ausência de profissionais habilitados e mesmo do cirurgião plástico é explicada pela má-distribuição dos profissionais no território nacional, tendo esta uma preferência em sua maioria pela região sudeste. E em outros casos (fato este cada vez mais comum) há  falta de interesse por parte dos mesmos devido a competição com a cirurgias estéticas. Em um outro cenário, existe o cirurgião plástico geral porém este não tem formação ou pior, não tem interesse na área oncoplástica frente a inferior remuneração quando comparada com procedimentos estéticos de cirurgia plástica geral. De fato, o domínio do sistema de saúde suplementar nestes centros e a baixa remuneração por cirurgias reconstrutivas levam ao pouco interesse por parte da grande maioria dos cirurgiões plásticos não locados ou sem vínculos com a universidade. 


Isto é uma realidade atual e constatado em diversas regiões do Brasil e até em algumas grandes capitais. Dificuldades no agendamento cirúrgico conjunto com o colega mastologista ou mesmo tempo cirúrgico prolongado também são mencionados como dificuldades para a atuação na área oncoplástica. Desta forma, e frente à essas limitações muitos mastologistas procuraram em outros países o complemento necessário para a execução completa da sua especialidade. Alguns foram muito bem sucedidos e realizam atualmente com grande competência o tratamento adequado das diferentes deformidades da mama. Apesar de serem casos isolados, muitos destes participam hoje de centros de formação nos quais novos residentes tem contato com técnicas básicas de reparação da mama. 


Todavia, ainda é necessário a participação do cirurgião plástico com experiência na área de oncoplástica e mais ainda no contexto multidisciplinar. É saudável esta relação, aprimora ambas especialidades e optimiza o tratamento do câncer de mama e a reabilitação. Os interessados na área reconstrutiva devem se adestrar e se aprimorar nos grandes centros, mas também deve-se ter em mente que o ambiente multiprofissional ainda será mais produtivo para ambas especialidades.


Desta forma, talvez o futuro seja o profissional completo independente da sua formação primária, qual seja em cirurgia plástica ou mastologia. No presente momento, este profissional ainda não está presente em todos os segmentos e regiões e tem carências na formação em áreas relacionadas, seja ela oncológica ou reconstrutiva. Desta forma, é importante ainda o enfoque multidisciplinar e o intercâmbio de informações com objetivo de se aprimorar e atendimento a paciente com câncer de mama.