Aspectos Atuais da Reconstrução da Mama

A reconstrução mamária é parte do tratamento global do câncer de mama e desempenha importante papel no difícil processo de reabilitação. O enfoque multidisciplinar, o planejamento pré-operatório e a indicação individualizada e correta de diferentes técnicas são fundamentais para o sucesso da reconstrução e satisfação com o resultado.

domingo, 13 de março de 2011

Reconstrução Mamária - É um Procedimento para todas as Mulheres com Câncer de Mama ?



Alexandre Mendonça Munhoz


Acessibilidade na Reconstrução Mamária 
Em 2011, é um procedimento para todas as mulheres com câncer de mama ?


Painel de Câncer de Mama e Reconstrução Mamária - TV Bandeirantes de Televisão - Programa Viviane Romanelli - Representando o Hospital Sírio-Libanês Núcleo de Mastologia, participaram do Painel os Drs. Alexandre Mendonça Munhoz e Alfredo Barros. Cirurgia Oncoplástica - Oncoplastic Surgery - Reconstrução da Mama - Breast Reconstruction


Inúmeros estudos, em sua maioria retrospectivos, evidenciam os benefícios psicológicos e aspectos outros relacionados a imagem corporal e qualidade de vida em pacientes submetidas a reconstrução da mama com técnicas de cirurgia oncoplástica. É fato que as técnicas de reconstrução da mama apresentam papel importante nas pacientes com câncer de mama e estadios I e II e apresentam benefício em termos de planejamento de incisões, reparação imediata e aumento da radicalidade da ressecção na grande maioria das pacientes submetidas a cirurgia conservadora da mama. Ademais, comprovou-se nos últimos anos, a necessidade técnica dos procedimentos de reconstrução, principalmente nas situações as quais envolvem as cirurgias com preservação de pele (skin-sparing mastectomy, cirurgia redutoras de risco/adenomastectomias) e, sobretudo os tumores localmente avançados (T4 e tumores inflamatórios).

Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica - Indicações e Necessidades - Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Apesar destas constatações e das inúmeras vantagens proporcionadas as pacientes submetidas a reconstrução, existem atualmente algumas disparidades em relação ao acesso de informação sobre as técnicas de cirurgia oncoplástica, a acessibilidade destes procedimentos para as pacientes com diagnóstico de câncer de mama e o número de reconstruções realizadas em relação ao número de casos novos de câncer de mama. Em nosso meio, são escassos os dados relacionados ao número de cirurgias de reconstrução de mama realizados por ano uma vez que não se trata de procedimento de notificação compulsória. Em grandes centros multiprofissionais e terciários no atendimento de pacientes oncológicas, estipula-se que em quase 70 a 80% das pacientes com diagnóstico de câncer de mama tenham informação clara pré-operatória e por volta de 2/3 destas pacientes sejam submetidas a alguma técnica de reconstrução mamária. 


Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica - Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) - Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Ademais, estipula-se que em centros acadêmicos universitários com hospitais de nível terciário este número pode ser ainda maior uma vez que no planejamento multidisciplinar pré-operatório,  o cirurgião plástico participa de maneira ímpar na conduta cirúrgica e na reabilitação destas pacientes. Todavia, quando avaliamos o sistema de saúde suplementar (planos de saúde/seguros) e, principalmente o sistema de saúde pública não vinculado a centros acadêmicos, o número de reconstruções realizadas em relação ao número de diagnósticos de câncer de mama apresenta-se em um nível muito inferior. Mensura-se de maneira indireta que menos de 10% das pacientes neste cenário sejam submetidas a reconstrução da mama.


Desta forma, e frente a esses números, alguns questionamentos são naturais e as razões para tal disparidade nos levam a uma reflexão mais aprofundada. Na nossa realidade, fatores como a escassez de recursos públicos e a prioridade em outras áreas ditas "mais prioritárias" podem ser aventadas como as razões principais para o insuficiente número de reconstruções realizadas. Ademais, sabemos que a informação que chega na paciente nem sempre é de maneira clara e, sobretudo completa. No sentido de priorizar o atendimento e tratamento do câncer sob o ponto de vista exclusivo da cura, outros aspectos também importantes e relevantes na terapêutica global são esquecidos ou mesmo deixados em segundo plano pelos profissionais de saúde, e no caso, a reconstrução da mama. 




Não menos importante são fatores relacionados com a formação curricular dos profissionais que assistem de maneira primária as pacientes com diagnóstico de câncer mamário. Neste cenário se enquadram cirurgiões oncológicos, mastologistas, oncologistas e ginecologistas que são de maneira direta e indireta os principais médicos que atendem a paciente com câncer de mama. Sabe-se que a maioria das técnicas de reconstrução e procedimentos oncoplásticos foram introduzidas em maior escala na prática clínica a partir da década de 80 e 90. Desta forma, muitos destes profissionais embora que competentes em sua área específica de atuação, tiveram pouca ou nenhuma informação curricular durante sua formação acadêmica sobre a reconstrução mamária e a participação do cirurgião plástico no contexto multidisciplinar. Assim, é natural que por desconhecimento ou mesmo por não priorização, a reconstrução da mama não é colocada de maneira clara e como parte integral do tratamento cirúrgico do câncer mamário.


Alguns estudos realizados nos EUA nos últimos anos abordaram este tema com maior profundidade. Neste contexto, merece destaque o estudo realizado e ainda não publicado pelo grupo de Duarte/CA (City of Hope - Los Angeles) e o estudo da Universidade de Michigan publicado em 2009 no Journal of Clinical Oncology. No primeiro estudo realizado recentemente pelo grupo de Cirurgia Oncológica do City of Hope National Medical Center na Califórnia/EUA, foi apresentado em abril/2010 no congresso anual da American Society of Breast Surgeons (ASBS) em Las Vegas pela primeira autora do estudo Dra. Laura Kruper de Duarte/CA e professora assistente do City of Hope. Segundo a Dra. Kruper, na Califórnia e em específico na região de Los Angeles houve um aumento do número de mastectomias no período de 2003 a 2007, todavia este aumento não foi acompanhado na mesma intensidade pelo número de reconstruções mamárias (21,4% em 2003 para 29,3% em 2007, número de mulheres mastectomizadas reconstruídas). 






Publicado na íntegra on-line neste mês no periódico Annals of Surgical Oncology*, o estudo avaliou a região do sudoeste da Califórnia em diferentes aspectos relacionados na opção e na realização da reconstrução da mama em pacientes com diagnóstico de câncer. Por meio de um programa de notificação compulsória de procedimentos médicos realizados (Office of Statewide Health Planning and Development (OSHPD)), foram avaliados todos os dados relacionados com as pacientes com diagnóstico de câncer de mama e tratamentos cirúrgicos e não cirúrgicos relacionados em um período de 2003 a 2007 e englobando 4 centros urbanos principais (Los Angeles, Bernardino, Orange e Riverside). Nos estudo e segundo os autores, fatores como aspectos culturais, socio-econômicos e a presença da radioterapia adjuvante são indagados como preditores na opção ou não pela reconstrução mamária imediata.




Kruper et al.
Annals of Surgical Oncology. 2011 (Epub ahead to print).





A Fundação City of Hope conta com mais de 100 anos de história e contabiliza mais de 40 centros avançados de tratamento do câncer, AIDS e diabetes nos EUA. No presente estudo realizado no City of Hope localizado no campus no noroeste da cidade de Los Angeles, foram avaliadas 14925 mulheres sendo que 35% das pacientes analisadas tinham entre 40 e 59 an0s, 30% entre 60 e 79 anos, 8,8% com mais de 80 anos e 5,5% com menos de 40 anos no momento do diagnóstico do câncer de mama e da mastectomia. Aproximadamente 50% das mulheres eram da raça branca, 4% da raça negra, 4,1% da raça amarela e 41% se intitulavam de outras raças. Em relação ao sistema de saúde suplementar, 32% apresentavam o Medi-cal, 15% o Medicare, 50% seguros de saúde privados e 1,7% outros planos de saúde não relacionados. 


Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction in Southern California. Kruper et al. 2011. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Na análise realizada e observando o período de 2003 até o ano de 2007, os autores observaram diferenças significativas na porcentagem de pacientes submetidas a reconstrução da mama. É interessante constatar que mesmo nos EUA, um país de primeiro mundo e com todos os recursos econômicos e tecnológicos disponíveis, menos de 30% das pacientes com diagnóstico de câncer de mama e submetidas ao tratamento cirúrgico eram também submetidas a reconstrução da mama. No ano de 2003, os autores constataram que aproximadamente 23% das mulheres com câncer mamário eram submetidas a reconstrução mamária sendo em sua maioria a reconstrução imediata (95%). Já no ano de 2007, essas taxas se elevaram para quase 28% das mulheres com diagnóstico de câncer mamário e também a grande maioria era submetida a reconstrução imediata. Desta forma, e nesta análise de quase 5 anos, 2/3 de todas as mulheres com câncer de mama não recebiam qualquer procedimento de reconstrução mamária na região do sul da califórnia de acordo com a coorte analisada pelo estudo.


Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction in Southern California. Kruper et al. 2011. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Quando os autores analisaram de maneira separada o fator "idade" também foram observadas diferenças importantes na indicação e na realização da reconstrução da mama pós mastectomia. Aproximadamente metade das reconstruções eram realizadas em mulheres com menos de 45 anos (47%). Trinta e seis por cento das reconstruções eram realizadas no grupo etário de 40 - 59 anos, 17% entre 60 a 79 anos e menos de 5% de todas reconstruções em mulheres com mais de 80 anos. Estas diferenças se mantiveram na análise realizada de 2003 a 2007 com distribuições semelhantes de acordo com as respectivas faixas etárias analisadas.


Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction in Southern California. Kruper et al. 2011. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Neste estudo é interessante observar ainda que a depender do tipo de plano/seguro de saúde que as pacientes com câncer de mama apresentavam, houve uma maior ou menor indicação das técnicas de reconstrução da mama. Assim, e analisando apenas o período de 2007, 40 % das reconstruções mamárias realizadas eram em pacientes com seguros de saúde privados, 13% no sistema de saúde Medicare, 11% no Medi-cal e menos de 7% nos outros tipos de planos de saúde.  Estas diferenças se mantiveram na análise realizada de 2003 a 2007 com distribuições semelhantes de acordo com os respectivos seguros de saúde analisados.


Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction in Southern California. Kruper et al. 2011. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Na análise multivariada destes fatores analisados, os autores observaram que a idade da paciente no momento do diagnóstico do câncer de mama, a raça, o tipo de plano de saúde e o hospital onde foi realizado o tratamento cirúrgico se mostraram como fatores preditivos e significantes na indicação e realização da reconstrução da mama pós mastectomia. Define-se como análise multivariada as relações entre duas ou mais variáveis onde todas as variáveis devem ser randomizadas e interelacionadas de modo que seus diferentes efeitos não adquiram significado quando interpretados separadamente. 


Painel de Câncer de Mama e Reconstrução Mamária - TV Bandeirantes de Televisão - Programa Viviane Romanelli - Representando o Hospital Sírio-Libanês Núcleo de Mastologia, participou do Painel o Dr. Alexandre Mendonça Munhoz. Cirurgia Oncoplástica - Oncoplastic Surgery - Reconstrução da Mama - Breast Reconstruction


Do ponto de vista estatístico, alguns autores acreditam que a proposta de uma Análise Multivariada é medir, explicar e predizer o grau de relação entre variáveis (combinação ponderada de variáveis). Outros autores acreditam que o que caracteriza a Análise Multivariada reside nas múltiplas variáveis (combinações múltiplas de variáveis), e não apenas no número de variáveis ou observações a serem estudadas. 




Neste presente estudo foram empregados ainda como análise a razão de chances (em inglês: odds ratio; abreviatura O.R.) que é definida como a razão entre a chance de um evento ocorrer em um grupo e a chance de ocorrer em outro grupo. Chance é a probabilidade de ocorrência deste evento dividida pela probabilidade da não ocorrência do mesmo evento. Uma razão de chances de 1 indica que a condição ou evento sob estudo é igualmente provável de ocorrer nos dois grupos. Uma razão de chances maior do que 1 indica que a condição ou evento tem maior probabilidade de ocorrer no primeiro grupo. Finalmente, uma razão de chances menor do que 1 indica que a probabilidade é menor no primeiro grupo do que no segundo.


Painel de Câncer de Mama e Reconstrução Mamária - TV Bandeirantes de Televisão - Programa Viviane Romanelli - Representando o Hospital Sírio-Libanês Núcleo de Mastologia, participaram do Painel os Drs. Alexandre Mendonça Munhoz e Alfredo Barros. Cirurgia Oncoplástica - Oncoplastic Surgery - Reconstrução da Mama - Breast Reconstruction


Nesta análise, mulheres com menos de 40 anos apresentaram odds ratio de 1,0 de realização da reconstrução quando comparado com mulheres com mais de 80 anos (OR 0,07 (0,05-0,10)). No que tange o critério raça como indicação da reconstrução mamária, as mulheres de origem asiática apresentaram menor indicação da reconstrução com um OR de 0,34 (0,26-0,44) quando comparado com as mulheres de raça branca (OR 1,00). Já no quesito tipo de seguro de saúde, as mulheres com planos privados/particulares apresentaram quase 8 vezes (OR: 7,81 (6,59-9,25)) mais chances de terem a reconstrução que as mulheres com seguros públicos como Medicare/Medi-cal.


Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction in Southern California. Kruper et al. 2011. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Em relação ao tipo de hospital onde foi realizado o tratamento cirúrgico, quais sejam privado, público, de comunidade ou universitário/acadêmico também foram observadas disparidades na indicação da reconstrução mamária. Pacientes submetidas ao tratamento cirúrgico em hospitais vinculados a Universidades tiveram quase 2 vezes mais chances (OR: 2,08 (1,85-2,33)) de terem a reconstrução que as pacientes submetidas ao tratamento em centros não acadêmicos. Provavelmente este último fator está relacionado ao maior enfoque multiprofissional nestes centros, a maior atualização do corpo docente e entendimento das técnicas atuais de reconstrução no tratamento do câncer, além claro da maior humanização, característica esta de centros formadores de opnião e reflexão do conhecimento médico atual.






Outro estudo não menos importante foi realizado pelo Grupo de Cirurgia Plástica da Universidade de Michigan / Ann Harbor Medical Center, o qual avaliou as disparidades étnicas e raciais na indicação da reconstrução da mama pós mastectomia. É interessante que apesar de também utilizar na casuística uma subpopulação da mesma região analisada pelo primeiro estudo (Los Angeles), o grupo de Michigan também analisou mulheres provenientes de uma região totalmente distinta nos EUA, no caso a região norte-central do país e em específico a área urbana de Detroit. Ademais, neste último estudo foram analisados grupos étnicos ditos "minoritários" como os latinos e principalmente os recém imigrados (no estudo são chamados de não aculturados). Publicado em 2009 em um importante periódico de oncologia clínica americano, o Journal of Clinical Oncology, o estudo de Michigan avaliou inicialmente 3252 pacientes com diagnóstico de câncer de mama in situ e invasivo e registrados nos centros de Los Angeles/CA e Detroit/MI nos EUA nos períodos de 2005 a 2007. Na casuística 40,9% eram da raça branca, 33,5% da raça negra, 41% de origem latina altamente aculturada e 13,5% de origem latina não aculturada (imigrantes recentes). 




Alderman et al.
J Clin Oncol. 2009. 10;27(32): 5325-5330.




Como em qualquer estudo, houveram critérios de inclusão e exclusão e nem todos os pacientes selecionados participaram de toda a análise estatística. Neste grupo de 3252 pacientes, foram incluídos na análise final apenas 806 pacientes (370 de origem branca; 202 de origem negra; 107 de origem latina e aculturada; 127 de origem latina e não aculturada), os quais foram localizados e completaram todas as etapas da análise. Ademais, estas foram as pacientes também submetidas a mastectomia como tratamento cirúrgico com e sem reconstrução mamária imediata e tardia. As demais pacientes não foram incluídas na análise uma vez que não foram localizadas, ou não completaram todas as etapas ou foram submetidas ao tratamento conservador da mama e, portanto excluídas da análise final. Na análise geral, 34,6% das pacientes com diagnóstico de câncer de mama receberam reconstrução mamária como parte do tratamento cirúrgico, sendo 84,5% no mesmo tempo da mastectomia e 15,5% em um segundo tempo cirúrgico. 


Racial Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction. Alderman et al. 2009. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Na análise dos autores, foram observadas diferenças significativas quanto a raça onde 40,9% da raça branca foi submetida a reconstrução. Em relação as demais origens étnicas avaliadas, 33,5% da raça negra, 41,5% das de origem latina aculturada e apenas 13,5% das de origem latina não aculturada foram submetidas a reconstrução pós mastectomia (p<0,0001). Neste último grupo de latinos não aculturados, os autores observaram que apresentavam menor escolaridade e possuíam menor acesso ao seguro de saúde que os demais grupos. Outra diferença importante observada foi que aproximadamente 14% do grupo latino não aculturado não tinha/não recebeu qualquer informação sobre técnicas de reconstrução, fato este observado em apenas 2% nos demais grupos (p<0,001).


Universidade de Michigan - Medical Scholl - Breast Reconstruction - Oncoplastic Surgery - Alexandre Mendonça Munhoz


Na análise multivariada, os autores observaram que a idade da paciente no momento do diagnóstico do câncer de mama, a raça, e o tipo de plano de saúde se mostraram como fatores preditivos e significantes na indicação e realização da reconstrução da mama pós mastectomia. Nesta análise, mulheres com menos de 40 anos apresentaram odds ratio de 1,0 de realização da reconstrução quando comparado com mulheres com mais de 69 anos (OR 0,06 (0,02-0,21)). No que tange o critério raça/etnicidade como indicação da reconstrução mamária, as mulheres de origem latina e não aculturadas apresentaram menor indicação da reconstrução com um OR de 0,35 (0,15-0,78) quando comparado com as mulheres de raça branca (OR 1,00). Já no quesito tipo de seguro de saúde, as mulheres sem qualquer plano de saúde apresentaram OR de 0,36 (0,13-1,00) de terem a reconstrução do que as mulheres com seguros de saúde privados (OR:1,00).


Racial Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction. Alderman et al. 2009. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Sem dúvida, o acesso a informação e a segurança passada pela equipe médica sobre as distintas formas de tratamento são fundamentais na escolha das inúmeras formas de tratamento. Na reconstrução da mama, estes aspectos não são diferentes e o próprio grupo de Michigan reconhece na análise dos grupo minoritários como os de origem latina não aculturados. Neste grupo que apresentou a menor taxa de reconstrução, 13,8 % das mulheres não tiveram qualquer informação sobre a reconstrução e não sabiam como realiza-la. Quando comparado a mesma informação com os grupos de etnias brancas e negras a taxa de desconhecimento dos métodos foram 1,9 e 1,7% respectivamente (p<0,001). Nesta mesma análise, 16,5% das mulheres latinas estavam extremamente preocupadas com os custos adicionais da reconstrução da mama no tratamento global do câncer de mama. Todavia, a mesma preocupação foi observada em 5,3 e 5,7% das mulheres de etnia branca e negra respectivamente (p=0,005). 


Racial Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction. Alderman et al. 2009. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Quando foram analisados o papel de cada profissional na abordagem da reconstrução como parte do tratamento do câncer de mama, diferenças mais acentuadas entre os diferentes grupos étnicos foram observados. No estudo quando se indagou se algum cirurgião da equipe oncológica explicou previamente as opções de reconstrução, foram observadas respostas semelhantes nas pacientes pertencentes as etnias brancas e negras o que correspondeu a 82,2 e 84,5 % de positividade respectivamente. Todavia, a mesma questão para o grupo latino representou a positividade de resposta em 77,8% no grupo aculturado e 65,3% no grupo não aculturado (p=0,001). No que tange a presença do cirurgião plástico na abordagem multidisciplinar e na consulta pré-operatória, as diferenças foram ainda mais acentuadas. 






Nesta análise, 72% das pacientes de origem branca e 53,9 % das de origem negra passaram em consulta pré-operatória com o cirurgião plástico sobre as diferentes técnicas de reconstrução. Já no grupo de origem latina, aculturada e não aculturada, essas taxas foram de 36 e 18,1 % respectivamente. As mesmas discrepâncias foram observadas na vontade das pacientes em obter informações e possibilidade de reconstruir a mama no momento do tratamento do câncer de mama. Neste último cenário, 55,9 % das mulheres latinas não aculturadas e 30 % das latinas aculturadas desejaríam ter tido mais informação sobre a reconstrução antes do tratamento do câncer de mama. Todavia, apenas 17% das mulheres de origem branca e 27% das de origem negra sentiam necessidade de ter tido mais conhecimento prévio sobre os procedimentos de reconstrução mamária.


Racial Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction. Alderman et al. 2009. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


É claro que, de uma maneira direta ou indireta e mesmo em um maior ou menor grau, estes aspectos distintos da aplicação da reconstrução mamária em diferentes grupos etnicos com o mesmo diagnóstico apresentaria repercussões na esfera psico-social e mesmo no tratamento e reabilitação pós câncer de mama. Neste mesmo estudo, os autores foram felizes em avaliar o grau de satisfação com o tratamento nos distintos grupos previamente estudados. Assim, e de maneira contundente, observou-se que no grupo submetido a reconstrução da mama, 94 e 91 % das mulheres brancas e negras ficaram satisfeitas com o tratamento e resultado respectivamente. Todavia, nos grupos de pacientes latinas (aculturadas e não aculturadas) essa taxa alcançou 79% de satisfação com o tratamento. Já nas pacientes não submetidas a reconstrução e avaliadas quanto a satisfação nos distintos grupos étnicos, 85 e 78 % das mulheres brancas e negras ficaram satisfeitas com o tratamento e o resultado respectivamente. Já nos grupos de pacientes latinas, as aculturadas apresentaram taxas de satisfação de 69% e as não aculturadas essa taxa alcançou 56%  com o tratamento.


Racial Disparities in Reconstruction Rates After Mastectomy: Patterns of Care and Factors Associated with the Use of Breast Reconstruction. Alderman et al. 2009. Reconstrução mamária e cirurgia oncoplástica Dr.  Alexandre Mendonça Munhoz - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.


Nesta análise e perfazendo um paralelo com a nossa realidade em um cenário de menor poder aquisitivo e acesso ao sistema de saúde, podemos concluir os diferentes aspectos da cirurgia oncoplástica e a distinta acessibilidade as técnicas oncoplásticas que dispomos atualmente. Se estes aspectos são uma realidade atual nos EUA por meio da análise de 2 estudos importantes sobre o tema, é claro que a mesma realizade é observada em nosso meio, apesar de não possuírmos dados objetivos sobre o tema. Em nosso meio é fato que as mulheres de maior poder aquisitivo e que possuem seguros de saúde privados e de boa qualidade apresentam um tratamento global diferente das mulheres que não possuem as mesmas características, sobretudo em relação a reconstrução da mama. 


Painel de Câncer de Mama e Reconstrução Mamária - TV Bandeirantes de Televisão - Programa Viviane Romanelli - Representando o Hospital Sírio-Libanês Núcleo de Mastologia, participaram do Painel os Drs. Alexandre Mendonça Munhoz e Alfredo Barros. Cirurgia Oncoplástica - Oncoplastic Surgery - Reconstrução da Mama - Breast Reconstruction


Em hospitais ditos de comunidade (atenção primária e secundária) e não vinculados a serviços acadêmicos é uma realidade a ausência de reconstrução no tratamento cirúrgico do câncer de mama. O mesmo cenário é observado em planos de saúde de baixa qualidade, uma vez que por razões de gestão financeira ou por mero desconhecimento/ignorância sobre o tema, interpretam a reconstrução mamária como procedimento de natureza estética e, portanto não passível de cobertura. Já, em hospitais universitários terciários e públicos pode-se assegurar que o tratamento é oferecido de maneira homogênea a todas as pacientes, independente das características sócio-econômicas e etnias. Todavia, e como são poucos serviços, é natural uma certa demora no atendimento e até a presença de "filas" para o agendamento da cirurgia de reconstrução. 




É fato que ainda existem, não só no nosso meio mas também em países desenvolvidos, distintos aspectos quanto ao acesso da informação e a realização dos diferentes procedimentos de reconstrução da mama. Questões sócio-econômicas, seguridade social, disponibilidade técnica por parte de cirurgiões plásticos e mastologistas e, sobretudo conhecimento e oferecimento dos procedimentos por parte da equipe médica para as pacientes, estão diretamente relacionadas com a maior ou menor indicação da reconstrução no tratamento do câncer mamário. Vale salientar que mesmo em classes mais favorecidas (etnia branca, nível de escolaridade terciário e plano de saúde particular) e em um país de 1o. mundo como os EUA, na mais otimista das estatísticas, apenas 40% das mulheres realizam a reconstrução da mama (imediata ou tardia) como parte do tratamento global do câncer mamário.





Desta forma o grupo de Michigan ressalta que esforços são necessários para promover, divulgar e esclarecer os benefícios da reconstrução da mama no contexto do tratamento do câncer mamário. Ademais, há a necessidade de atenção especial em grupos minoritários e no cenário avaliado pelo estudo, as mulheres de origem latina e não aculturadas uma vez que a informação sobre a reconstrução foi nitidamente insuficiente, a participação do cirurgião plástico no tratamento multidisciplinar foi menor e, portanto o grau de insatisfação neste grupo foi consideravelmente maior. Os autores advogam ainda que em grupos minoritários e que não possuem sistema de saúde suplementar (seguros) há a necessidade de entidades não governamentais atuando em conjunto no sentido de oferecer suporte financeiro na informação e no custeo da reconstrução. Entre as entidades mais destacadas, os autores mencionam o papel importante da Cure Foundation e da Susan G. Komem no amparo das classes menos favorecidas no que tange ao suporte fincanceiro da reconstrução, reabilitação e reinserção destas mulheres no contexto familiar, social e produtivo.


Susan G. Komem Foundation - Breast Reconstruction - Oncoplastic Surgery - Dr. Alexandre Mendonça Munhoz


Apesar destes aspectos, e concluindo a leitura sobre esta distinta faceta da cirurgia oncoplástica atual , torna-se importante enfatizar que estes cenários observados de maneira objetiva e científica em um país de 1o. mundo devem ser muito mais evidentes e marcantes no nosso meio com recursos sócio-econômicos  limitados. É fato também que, fatores outros além da questão etnia, idade e valores econômicos devem ser ponderados também, além dos aspectos enfatizadas nos dois estudos analisados. Podemos ainda refletir sobre o papel de outros fatores como doenças clínicas associadas (hipertensão, diabetes) que impedem ou dificultam a reconstrução, a não valorização por parte da paciente de aspectos relacionados a sua imagem corporal, o medo e a ansiedade de recuperação mais precoce e sem complicações e fatores controversos relacionados ao tratamento adjuvante (e em específico a radioterapia), que de maneira maior ou menor também estão implicados na indicação da reconstrução mamária no dias de hoje. Para isto, outros estudos e reflexões serão necessários...


Dr. Alexandre Mendonça Munhoz - Reconstrução Mamária e Acessibilidade as Diferentes Técnicas de Reconstrução - Cirurgia Oncoplástica - Oncoplastic Surgery - Breast Reconstruction.